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Cibertúlia

Dúvidas, inquietações, provocações, amores, afectos e risos.

Abril 18, 2014

Já dois não eleitos discursaram no Parlamento

Miguel Marujo

[Ao contrário do que dizem um ministro e dois deputados, é possível a um não eleito falar do púlpito da sala de plenários da Assembleia da República, como prevê o regimento do próprio Parlamento e como já aconteceu. E como já pude noticiar no DN.]

 

«"Tem a palavra o senhor professor doutor Rui Alarcão, cancelário reitor da Universidade de Coimbra." Foi com estas palavras que o presidente da Assembleia da República, o social-democrata Vítor Crespo, a 14 de novembro de 1990 - governava então o PSD - chamou ao púlpito da sala de plenários do Parlamento o reitor de Coimbra, para se dirigir aos deputados, na reunião plenária de 13 de novembro de 1990.

O motivo eram os 700 anos da universidade e a câmara reunia-se para essa "sessão solene comemorativa", como se lê no Diário da Assembleia da República. Rui Alarcão iniciaria a sua intervenção sublinhando  o "ineditismo" do convite - apesar de já existir um caso de intervenção de um não eleito ou não governante no Parlamento.

"Entendeu a Assembleia da República, no ano [1990] em que a Universidade em Portugal comemora sete séculos de existência, solenizar o acontecimento com uma sessão comemorativa. Nesta sessão, que [...] nos congrega, é-me dada a palavra como reitor da Universidade de Coimbra, a mais antiga do País e que legitimamente assume ou encabeça esse mesmo VII Centenário. Aceitei esse convite, cujo ineditismo singularmente reforça a honra que envolve, com uma funda emoção e gratidão."

O então reitor de Coimbra falava assim numa reunião deste órgão de soberania, como têm pedido os militares de Abril - em relação à sessão solene do 25 de Abril. Esta possibilidade cabe nas competências de quem é presidente da Assembleia da República, como define o regimento. No artigo 16.º, na "competência quanto aos trabalhos da Assembleia", diz-se que, neste caso, Assunção Esteves pode "convidar, a título excecional, individualidades nacionais e estrangeiras a tomar lugar na sala das reuniões plenárias e a usar da palavra".

Antes, na sessão solene do 5 de Outubro, em 1983, Tito de Morais, o presidente da Assembleia à época, também tinha dado a palavra a um cidadão não eleito. Com uma diferença, sublinhada ao DN por fontes das várias bancadas parlamentares: a intervenção de Afonso Costa (filho do ministro da Justiça, da I República) tinha sido no átrio do Palácio de São Bento. Sete anos depois, Rui Alarcão subia ao púlpito da sala de plenários. Um ato que permanece único, quase 24 anos depois.

Miguel Marujo, DN (edição papel), quinta-feira, 17 de abril.