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Cibertúlia

Dúvidas, inquietações, provocações, amores, afectos e risos.

Janeiro 19, 2022

Da extrema-esquerda de 1976 já só resta o PCTP/MRPP

Miguel Marujo

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Era válido em 2019, data deste artigo, continua válido em 2022 para estas eleições legislativas. Neste artigo, só não se contava como Paisana e Cidália (que ontem participou no debate dos partidos sem assento parlamentar para estas eleições) receberam o jornalista à porta com a exclamação "é preciso ter lata!", entre vernáculo que se evita publicar. Aquela sede foi também abandonada. O fim da subvenção pública, de partido com mais de 50 mil votos, a isso obrigou.

 

O PCTP/MRPP é o último partido da extrema-esquerda dos anos 1970 que sobrevive no boletim de voto, depois de o POUS ter desaparecido nas eleições legislativas de 2015 e nas europeias deste ano [de 2019]. Em 2014, para o Parlamento Europeu, foi o partido menos votado.

A 6 de outubro, o Partido Comunista dos Trabalhadores Portugueses (PCTP/MRPP), apresenta listas em todos os círculos eleitorais, com Maria Cidália Guerreiro em Lisboa e João Morais no Porto. Agora órfão do seu fundador Arnaldo Matos, que morreu em 22 de fevereiro, e sem aquele que foi o seu rosto nas últimas duas décadas até 2015, Garcia Pereira, o discurso é o de desconfiar das "eleições burguesas".

Como "partido comunista", o PCTP "nunca alimentou nem alimenta quaisquer ilusões nas eleições burguesas como forma de resolver os problemas essenciais do povo trabalhador português e, quando concorre, fá-lo para aproveitar este período para fazer propaganda do programa dos comunistas e com vista a reforçar a sua organização", lê-se no jornal oficial do partido Luta Popular.

Ao Pote de Água, em Lisboa, as montras da sede são o espelho do partido que se prepara para as eleições legislativas: livros de Lenine, como O Que É o Marxismo, ou o Manifesto do Partido Comunista, de Marx e Engels, e as Teses da Urgeiriça, que Arnaldo Matos escreveu em 2016, e cópias de textos do jornal que hoje é exclusivamente online.


Nos vidros há um poema de homenagem ao fundador e um tweet seu em que se lê: "A classe operária portuguesa deve organizar-se sob a teoria do marxismo, a ideologia do comunismo internacionalista, para conduzir a revolução portuguesa à vitória contra o capitalismo e o imperialismo." Em frente, do outro lado da Avenida do Brasil, um mural pede o "FMI fora de Portugal", com o desafio "Não pagamos! Por um governo democrático e patriótico".

Ao toque da campainha, identificado o jornal e o jornalista, o dirigente do partido Carlos Paisana recusou-se a prestar declarações, no que foi acompanhado por Cidália Guerreiro. Na montra, num dos textos fotocopiados, queixam-se dos jornalistas que terão "ignorado" a sua presença no tribunal onde foi entregue a lista de Lisboa.


O partido conta desde 2009 com a subvenção pública para os partidos que, não elegendo deputados, consigam mais de 50 mil votos. Foram 14 800 euros mensais entre 2011 e 2015, e um pouco menos desde 2015 (14 300 euros). Este financiamento está em risco
: depois da saída de Garcia Pereira, que se demitiu em 18 de novembro de 2015, depois de críticas violentas de Arnaldo Matos à prestação eleitoral do PCTP, o partido viu a sua votação dar um trambolhão nas europeias de maio, com menos de metade dos votos de cinco anos antes: 27 222 (0,82%). Em 2014, o PCTP chegou a 54 622 votos (1,66%) para o Parlamento Europeu e, no ano seguinte, nas legislativas teve 59 955 votos (1,11%).

Nas europeias de 2014 participou o outro partido da extrema-esquerda que resistia desde os anos 1970: o POUS de Carmelinda Pereira e Aires Rodrigues, expulsos do PS em 1977, formaram este "partido da 4.ª Internacional". Hoje, à porta da sede não há nada que identifique o partido. Só espreitando pelo vidro se vê "POUS" na caixa de correio. Resiste na net, publicando um blogue. Não foi possível qualquer contacto com o POUS: o telefone já não existe e ninguém respondeu ao e-mail enviado.

[artigo originalmente publicado no Diário de Notícias, a 13 de setembro de 2019; foram mantidos os links originais do artigo, foto: Arnaldo Matos, de pé, e Garcia Pereira, ao lado, com a cara tapada pelo microfone, numa ação de campanha em 1983. © Rui Homem/Arquivo DN]

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