Agosto 01, 2003
O voto, sff - réplica
Miguel Marujo
Caros confrades de discórdia
Agradeço que tenham respondido à provocação que aqui deixei há dias, sobre o resgate do voto. Tentarei contrapor, sem exageros, mas se o teclado me puxar para a hiperbole, peço desde já desculpas.
Diz Zé Manuel que «por vontade do povo tínhamos estádios de futebol novos em vez de saneamento básico e água potável». Diz SirHaiva: «A falta de maturidade política de grande parte da população tenderia a re-eleger/demitir políticos com demasiada "à-vontade", conforme as políticas agradassem ou não».
Aqui está a minha primeira contestação. Serão os meus caros interluctores «parte do povo» e por isso devo entender que, por si, preferem estádios de futebol a água potável? Ou será que não são «parte do povo»? Então, coloco a questão, quem é o «povo»? São os taxistas, as engomadeiras, os que têm passe social, os sócios do benfica, os guardas-nocturnos? E nós, os blogueiros, a clique, a intelectualidade, a elite?
Isto de nos pormos a adivinhar o que o «povo pensa» ou o que o «povo quer» é de uma arrogância tremenda, que, sinceramente, me faz frio na espinha. porque o povo somos nós. Todos. É um dos três pilares fundamentais para a existência de uma soberania, de um país. Lamento se isto choca, mas o povo somos mesmo nós. Eu, tu e todos os outros que viste ontem, hoje e aqueles que verás amanhã.
Mas nem em tudo discordo. Volto à citação de Zé Manel: «A democracia é um processo em construção. Passa pelas relações laborais, com os chefes, com os colegas e com os subordinados. Passa pela atenção e pela reflexão do que se diz e faz. Passa pelo voto consciente. Passa pela relação com a pessoa amada.». De acordo. Mas a democracia é, acima de tudo, a participação. Ora, quando proponho que possamos reclamar o voto de volta é por uma razão complexa, que tentarei explicar, se conseguir:
1. A abstenção sobe em flecha. É um facto. Aqui e nos países ditos desenvolvidos.
2. Como bem diz SirHaiva, «Os agentes económicos, os investidores, não pactuam com este tipo de instabilidade governativa. Fogem disso a sete pés. E são estes investidores que, quer se queira quer não, são o motor das actuais organizações político/sociais». Ora, aqui está o busílis. Os Governos cometem um erro tremendo, que é apontado por politólogos, sociólogos e outros quejandos: em vez de se unirem à sociedade, estão à mercê do dinheiro (o eurostat, o pib, o défice, para não falar do FMI, dos bancos que emprestam dinheiro à RTP, ou de coisas ainda mais assustadoras, como a Maçonaria, etc).
Isto é um mau princípio, dado que o poder tem e deve estar no povo, não na banca, na finança, nas sociedades secretas. Porque esta é desigual, aquele não. Como dizia um amigo, se os votos em Portugal fossem como no Benfica, o PCP ganhava, porque os eleitores são idosos e teriam direito a 70 votos e nós a meia dúzia.
3. O exemplo italiano de democracia inconstante e governos em queda mal chegavam ao poder algum dia deu instabilidade económia à Itália que a fizesse sair dos G8? Desviar-se do Pacto de Estabilidade? Nem por isso. Será melhor ter um Berlusconni que legisla para se safar - mas é estável - a ter governos sucessivos mas que governem?
Não nego que à primeira contrariedade muitos iriam a correr pedir o voto de volta. Por isso a proposta vem com um número: 66 por cento, dois terços, o mesmo que, em termos representativos, serve para alterar a CRP.
Mas com o tempo, será natural que a estrutura entre nos eixos, e que a responsabilidade partilhada DE FACTO entre legislador e povo passe a um equilibro que não existe. É que a fiscalização passaria a ser vossa, minha, de todos nós. A propósito, têm ideia de quem é o vosso deputado? Quem de facto vos representa?
E mais: perante o programa eleitoral, as promessas eleitorais, existe algum órgão que fiscalize o seu cumprimento? A resposta é «não».
Proponho uma vista de olhos ao que Dutra fez em Rio Grande do Sul. Não foi populista, criou orçamentos participativos, mexeu com a sociedade, enfrentou o capital e conseguiu desenvolver aquele Estado. E, com toda a naturalidade, foi derrotado nas últimas eleições, embora sirva de exemplo a muitos pensadores da geração «no logo». Saiu e aceitou.
O povo será assim tão imberbe ou, como dizia o FMI (cito de memória, que é fraca): «A ti não é qualquer Fernão Mendes Pinto de merda que te enfia a carapuça. (...)Tú és Sepúlveda, Tu és Adamastor, né, filho?»
Agradeço que tenham respondido à provocação que aqui deixei há dias, sobre o resgate do voto. Tentarei contrapor, sem exageros, mas se o teclado me puxar para a hiperbole, peço desde já desculpas.
Diz Zé Manuel que «por vontade do povo tínhamos estádios de futebol novos em vez de saneamento básico e água potável». Diz SirHaiva: «A falta de maturidade política de grande parte da população tenderia a re-eleger/demitir políticos com demasiada "à-vontade", conforme as políticas agradassem ou não».
Aqui está a minha primeira contestação. Serão os meus caros interluctores «parte do povo» e por isso devo entender que, por si, preferem estádios de futebol a água potável? Ou será que não são «parte do povo»? Então, coloco a questão, quem é o «povo»? São os taxistas, as engomadeiras, os que têm passe social, os sócios do benfica, os guardas-nocturnos? E nós, os blogueiros, a clique, a intelectualidade, a elite?
Isto de nos pormos a adivinhar o que o «povo pensa» ou o que o «povo quer» é de uma arrogância tremenda, que, sinceramente, me faz frio na espinha. porque o povo somos nós. Todos. É um dos três pilares fundamentais para a existência de uma soberania, de um país. Lamento se isto choca, mas o povo somos mesmo nós. Eu, tu e todos os outros que viste ontem, hoje e aqueles que verás amanhã.
Mas nem em tudo discordo. Volto à citação de Zé Manel: «A democracia é um processo em construção. Passa pelas relações laborais, com os chefes, com os colegas e com os subordinados. Passa pela atenção e pela reflexão do que se diz e faz. Passa pelo voto consciente. Passa pela relação com a pessoa amada.». De acordo. Mas a democracia é, acima de tudo, a participação. Ora, quando proponho que possamos reclamar o voto de volta é por uma razão complexa, que tentarei explicar, se conseguir:
1. A abstenção sobe em flecha. É um facto. Aqui e nos países ditos desenvolvidos.
2. Como bem diz SirHaiva, «Os agentes económicos, os investidores, não pactuam com este tipo de instabilidade governativa. Fogem disso a sete pés. E são estes investidores que, quer se queira quer não, são o motor das actuais organizações político/sociais». Ora, aqui está o busílis. Os Governos cometem um erro tremendo, que é apontado por politólogos, sociólogos e outros quejandos: em vez de se unirem à sociedade, estão à mercê do dinheiro (o eurostat, o pib, o défice, para não falar do FMI, dos bancos que emprestam dinheiro à RTP, ou de coisas ainda mais assustadoras, como a Maçonaria, etc).
Isto é um mau princípio, dado que o poder tem e deve estar no povo, não na banca, na finança, nas sociedades secretas. Porque esta é desigual, aquele não. Como dizia um amigo, se os votos em Portugal fossem como no Benfica, o PCP ganhava, porque os eleitores são idosos e teriam direito a 70 votos e nós a meia dúzia.
3. O exemplo italiano de democracia inconstante e governos em queda mal chegavam ao poder algum dia deu instabilidade económia à Itália que a fizesse sair dos G8? Desviar-se do Pacto de Estabilidade? Nem por isso. Será melhor ter um Berlusconni que legisla para se safar - mas é estável - a ter governos sucessivos mas que governem?
Não nego que à primeira contrariedade muitos iriam a correr pedir o voto de volta. Por isso a proposta vem com um número: 66 por cento, dois terços, o mesmo que, em termos representativos, serve para alterar a CRP.
Mas com o tempo, será natural que a estrutura entre nos eixos, e que a responsabilidade partilhada DE FACTO entre legislador e povo passe a um equilibro que não existe. É que a fiscalização passaria a ser vossa, minha, de todos nós. A propósito, têm ideia de quem é o vosso deputado? Quem de facto vos representa?
E mais: perante o programa eleitoral, as promessas eleitorais, existe algum órgão que fiscalize o seu cumprimento? A resposta é «não».
Proponho uma vista de olhos ao que Dutra fez em Rio Grande do Sul. Não foi populista, criou orçamentos participativos, mexeu com a sociedade, enfrentou o capital e conseguiu desenvolver aquele Estado. E, com toda a naturalidade, foi derrotado nas últimas eleições, embora sirva de exemplo a muitos pensadores da geração «no logo». Saiu e aceitou.
O povo será assim tão imberbe ou, como dizia o FMI (cito de memória, que é fraca): «A ti não é qualquer Fernão Mendes Pinto de merda que te enfia a carapuça. (...)Tú és Sepúlveda, Tu és Adamastor, né, filho?»