Saltar para: Posts [1], Pesquisa [2]

Cibertúlia

Dúvidas, inquietações, provocações, amores, afectos e risos.

Junho 29, 2014

"Vamos a isso que se faz tarde" (manifesto pelo jornalismo)

Miguel Marujo

40 anos depois do 25 de abril, a liberdade de imprensa sofre um dos momentos mais negros da sua história. Sabemos que as questões que afectam o jornalismo não lhe são exclusivas: esvaziamento das redacções, precariedade, concentração da propriedade. Mas o jornalismo tem responsabilidades específicas e, nesta altura, está em risco. Em causa está o próprio paradigma do direito e do dever de informar como sustentáculos fundamentais de uma sociedade moderna, livre e democrática.


A intenção anunciada de um brutal despedimento colectivo na Controlinveste constitui mais um golpe no panorama informativo e serve hoje de pretexto para nos encontrarmos sem nos esquecermos que este é um processo com décadas. Editorias devastadas, partes significativas do território sem cobertura. É demais para quem parte e é demais para quem fica.

 

Como garantir qualidade informativa sem meios? A falta de tempo, a superficialidade, as redacções amorfas, a precarização não são problemas novos. Temos grande responsabilidade pelo estado a que chegámos. Essa responsabilidade é colectiva mas começa por ser individual. Temos de ser exigentes com cada um de nós, com o colega do lado, com a chefia intermédia, a direcção e a administração. Mas só temos força e poder para exigir dos outros se nos organizarmos, se percebermos que somos classe. Da classe que somos fazem parte os que têm (ainda ou desde há pouco) redacções, os que são precários há 20 anos, os que estão a chegar à reforma, os que saíram pelo seu pé, os que não chegarão nunca a ter uma redacção, os que sonham com uma e a merecem. Juntos, somos e podemos. Cada um por si fica talvez muito pouco: a ilusão de um poder que já nem temos e que perderemos a oportunidade de recuperar se não agirmos já, com inteligência e exigência.


Noutros países, há órgãos colegiais ouvidos pelos partidos, pela tutela, pelos patrões, pelo público. Há fundos de greve usados para fazer greve, quando ela é a última possibilidade para salvar empregos, condições de trabalho, independência, liberdade, democracia. Sim, para tudo isso podemos contribuir, e tudo isso podemos ajudar a destruir. A indignação não pode desaparecer com a espuma dos dias. É obrigatório não prescindir de eleger os órgãos representativos em cada órgão de comunicação social (CR, CT e delegados sindicais) e importa pensar se não será útil formar um colégio que junte representantes de cada um para tornar mais eficazes acções de luta e projectos jornalísticos.


Por fim, mas não por último, é urgente pensar em soluções conjuntas para garantir que as centenas de jornalistas que nos últimos anos perderam os seus empregos possam, se essa for a sua vontade, voltar a trabalhar. Aceitar a inexorabilidade de decisões alheias sobre as nossas vidas e a nossa profissão é aceitar a nossa impotência e, em última instância, a morte do chamado 4º poder. Chegou a hora de acordarmos. Parafraseando o já tão saudoso Manuel António Pina: não é ainda o fim do mundo, mas já se faz tarde.

 

Ana Luísa Rodrigues
Myriam Zaluar
Sofia Lorena
Cláudia Henriques
Sofia Branco
Ricardo Alexandre
Nicolau Ferreira
Nuno Aguiar
Camilo Azevedo
António Granado
Fátima Mariano
Paulo Pena
Carla Baptista
Pedro Rainho
Tiago Contreiras
Paula Sofia Luz
Frederico Duarte Carvalho
Sara Figueiredo Costa
Augusto Freitas de Sousa
Guilhermina Sousa
Mariana Mata
Miguel Marujo
Alexandre Martins
Nicolau Ferreira
Luís Gouveia Monteiro
Maria João Guimarães
Cláudia Marques Santos
Ricardo J. Rodrigues
José Manuel Rosendo
Isabel Pereira Santos
José António Cerejo
Paulo Martins
Sandra Bernardes
Viriato Teles
Sandra Monteiro
Eugénio Alves
Sofia Quintas
António Loja Neves
Luís Reis Ribeiro
Catarina Almeida Pereira

(e quem mais queira assinar)