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Cibertúlia

Dúvidas, inquietações, provocações, amores, afectos e risos.

Novembro 29, 2011

Agarra que é ladrão

Miguel Marujo


Esta foto foi tirada esta terça-feira à tarde em São Bento pelo deputado do PCP, António Filipe, que a publicou no seu facebook. Em frente ao Parlamento manifestavam-se umas largas centenas, talvez mil estudantes do ensino superior. E para tamanha multidão a PSP deslocou o que se vê na imagem: 20 viaturas estacionadas defronte do edifício, mais umas quantas visíveis na rua em frente, sabe-se lá quantos escondidos no jardim de São Bento.

Há várias questões pertinentes que se colocam perante a imagem:
- quanto custou esta operação, claramente desproporcionada?
- quantas ruas ou zonas sensíveis de Lisboa não tinham àquela hora qualquer patrulhamento?
- quantos supostos "anarcas radicais" esperava a PSP encontrar naquela molhada?
- as manifestações pacíficas e ordeiras que se assistem em Portugal vão passar a ser acompanhadas por dispositivos idênticos (e para uma de milhares de pessoas quantos agentes é que o MAI vai pôr nas ruas)?

A conclusão disto tudo é só uma: instalou-se uma narrativa em que o MAI/Governo e PSP confundem exercício de autoridade com excesso de zelo e há que criminalizar as ruas e quem protesta. Isso é próprio de governos fracos: Cavaco Silva começou a perder a rua assim.



Novembro 28, 2011

Chorar em público

Miguel Marujo

Miguel Esteves Cardoso, 28-11-2011

 

«Quando sair este jornal, a Maria João e eu estaremos a caminho do IPO de Lisboa, à porta do qual compraremos o PÚBLICO de hoje. Hoje ela será internada e hoje à noite, desde o mês de Setembro do ano passado, será a primeira vez que dormiremos sem ser juntos.

O meu plano é que, quando me expulsarem do IPO, ela se lembre de ir ler o PÚBLICO e leia esta crónica a dizer que já estou cheio de saudades dela. É a melhor maneira que tenho de estar perto dela, quando não me deixam estar. Mesmo ficando num hotel a 30 passos dela, dói-me de muito mais longe.

O IPO consegue ser uma segunda casa. Nenhum outro hospital consegue ser isso. Podem ser hospitais muito bons. Mas não são como uma casa. O IPO é. Há uma alegria, um humor, uma dedicação e uma solidariedade, bem-educada e generosa, que não poderiam ser mais diferentes da nossa atitude e maneira de ser - resignada, fatalista e piegas - que são o default institucional da nacionalidade portuguesa. É graxa? Para que tratem bem a Maria João? Talvez seja. Mas é merecida. Até porque toda a gente que os três IPO de Portugal tratam é tratada como se tivesse direito a todas as regalias. Há muitos elogios que, não obstante serem feitos para nos beneficiarem, não deixam de ser absolutamente justos e justificados.

Este é um deles. Eu estou aqui ao pé de ti. Como tu estás ao pé de mim. Chorar em público é como pedir que nada de mau nos aconteça. É uma sorte. É o contrário do luto. Volta para mim.»

Novembro 27, 2011

O meu fado

Miguel Marujo

Para um miúdo de Aveiro, a canção de Lisboa era coisa longínqua, de uma Amália arrastada em coliseus e noites frias de galas cinzentas do fado. Felizmente a pop resgatou-me o fado: Mler Ife Dada, Os Dias da Madredeus, Anamar (e outros, vários outros). Depois foram os clássicos que se deram à descoberta e o fado novo ao enamoramento. O fado é de todos desde hoje. A notícia oficializou o que já sabíamos e que até os miúdos de Aveiro puderam descobrir sem ir à Bica ou à Mouraria.

 

[foto: A Naifa]

Novembro 24, 2011

Da greve

Miguel Marujo

Escrevi há dias que em Portugal fazer greve no sector privado não se resolve com uma simples equação de se ser contra ou a favor. Hoje, mais do que nunca, a precariedade - a real, através dos contratos a termo ou recibos verdes, ou a insinuada, pela discricionariedade no despedimento (por cá, é fácil despedir no privado, ao contrário do que insistem patrões e governantes) - é um dado adicional a ter em conta. Não lhe chamo medo nem receio, prefiro anotar o facto, sem o valorar.

 

A greve geral deve ser geral porque o programa de austeridade não se circunscreve a quem é funcionário público, apesar de ser na administração do Estado que os trabalhadores são mais penalizados e castigados. Levam pela bitola do patrão: é mais fácil tirar quando se tem a faca e o queijo na mão, mudando as leis a seu belo prazer.

 

Cá em casa, um faz, outro não. Eu vou noticiar a greve, porque a função social do jornalista também é dar rosto e dimensão a notícias significativas para o País.

 

Em nota de rodapé: na véspera da greve, houve duas notícias que dizem muito sobre este cenário de greve. Uma, em que o ministro das Finanças diz que o tempo não é de conflitos - é uma escola cavaquista esta de achar que a política é o coro da igreja onde se devem dar todos bem e todos devem engolir o que é dito pelos iluminados. Outra, em que se soube que o ministro Álvaro e mais três secretários de Estado têm direito aos subsídio de alojamento (legal): um Governo que corta subsídios a quem ganha miseravelmente, mantém subsídios obscenos para os seus próprios governantes. É imoral.

 

 

[este blogue pára simbolicamente por 24 horas.]

Novembro 22, 2011

Contadora de histórias

Miguel Marujo

 

Sorri ontem ao ver o cartaz de A Velha (em 2008 este cartaz espalhou-se pelas ruas de Lisboa). Eu lembro-me bem desse cartaz e (tolo) não reconheci nele a Prima, como lhe chamávamos, que sempre encheu a minha infância e adolescência de histórias.

Novembro 19, 2011

Mentiras

Miguel Marujo

Zapatero chegou ao poder porque Espanha não perdoou ao Governo Aznar a mentira dos atentados de 11 de Março. Agora Rajoy chegará ao poder porque os mercados insistem na mentira das taxas de juro dos países europeus.

Novembro 16, 2011

Dias higiénicos

Miguel Marujo

De folgas, por motivos vários, eis que me deparo em dias sucessivos com um conjunto de afirmações que devem ser manchetes do Inimigo Público. A sério, só pode ser isso. Destaco duas, que dizem quase tudo sobre o estado das coisas.


"2012 irá certamente marcar o ano de fim da crise."

 

"A bem da Nação", a informação emitida pela RTP Internacional deve ser "filtrada" e "trabalhada" pelo Governo, defendeu João Duque, nesta terça-feira de manhã. Um tratamento que, acrescentou, "não deve ser questionado".

Novembro 15, 2011

Corredores

Miguel Marujo

O cheiro dos corredores é sempre o mesmo. À entrada da sala, onde máquinas alimentam homens, desinfectam-se as mãos. E impregna-se o odor a álcool, imagem perene dessas visitas. Hoje devia ter gostado de ver o jogo ao nosso lado, sem máquinas. Para (apesar do resultado) lamentar a equipa e recordar como eles corriam em 1966. Mas ficar contente.

Novembro 15, 2011

«Quando tínhamos dinheiro, apostaram tudo no carro. Quando falta o dinheiro, cortam tudo no transporte público.»

Miguel Marujo

«Uma família em que recebe 1.500 euros cada um. São, portanto, de classe média. Nem ricos, nem pobres. Têm dois filhos dependentes. Não vivem com desafogo mas, na miserável média nacional, são "privilegiados". Os dois filhos andam na escola.

 

Vamos esquecer que lhes aumentaram o IVA em quase todas as compras que fazem. Que um deles é funcionário público e perdeu, nos próximos anos, o 13º mês e o subsídio de férias que servia para compor o orçamento familiar. Que lhes aumentaram o IMI, que os juros ao banco para pagar a casa também estão mais altos. Que lhes congelaram os salários. Que comprar casa é agora uma impossibilidade e que têm de contar com os filhos a viverem em casa deles muito para lá do que seria saudável, porque não vão arranjar emprego minimamente seguro para assumirem qualquer compromisso nem ter outro lado onde viver. Vamos esquecer tudo isto. Vamos até imaginar que não estão com a corda na garganta.

 

Os filhos vão sozinhos para a escola. De transportes públicos, tal como os pais que, conscienciosos e poupados, não tiram o carro da sua rua nos dias de semana. É bom para a autonomia dos filhos, para a carteira dos pais e para a cidade, que assim tem menos carros a circular. É até bom para a economia, que gasta menos a importar combustível. O preço dos transportes públicos aumentou, o que fez os pais repensarem se valeria a pena continuar a fazer isto. Mas o passe social dos miúdos ainda compensa. Esta semana, ficaram a saber que o passe social dos seus filhos aumentará para o dobro. Porque são ricos. Isto de serem "ricos", com dois salários de 1.500 euros, tem sido um desastre. Nos impostos, nos serviços públicos, em tudo.

 

Os pais fizeram as contas. Com os transportes públicos caros e sem passe social para os filhos, a despesa é incomportável. Sai mais barato irem todos no carro. Levarem e trazerem os filhos à escola. Têm lhes explicado, na televisão (jornais já não podem comprar), que é uma questão de justiça social. Eles não são pobres e o Estado a quem eles entregam uma parte significativa dos seus salários é para pobres (e para os bancos). Isto apesar de saberem que os pobres viram as suas prestações sociais reduzidas e os bancos, pelo contrário, podem sempre contar com dinheiros públicos. Mas adiante. Eles tomam a decisão economicamente racional de deixar de usar os transportes coletivos. Eles e os remediados que ainda optavam por eles. Mais uns milhares de carros na cidade. A poluír. A engarrafar o tráfego. A levar, com o tempo e a energia que se perde, a uma redução da produtividade. A fazer perder tempo. A obrigar a importar mais combustível e a piorar a nossa balança comercial. A degradar as vias públicas, obrigando a maior investimento do Estado em manutenção. A encher passeios, porque não há lugar para estacionar.

 

Vamos fingir que esta família é rica. Vamos fingir que não paga impostos e que por isso não tem, como os outros, direito a algum retorno do que paga. Vamos fingir que esse País estranho de que nos falam economistas, governantes e comentadores existe mesmo e esta gente vive desafogada. Mesmo assim, as coisas são simples para esta família: vai voltar ao carro que o começo da crise, numa das poucas coisas boas que parecia ter trazido, os tinha feito abandonar no seu quotidiano. Com menos gente, os transportes públicos, que são tanto mais sustentáveis quanto mais gente os usar, são cada vez mais difíceis de manter. Cada vez mais caros. Cada vez mais escassos.

 

Os discursos sobre a justiça social, para enganar papalvos e tentar que os pobres se convençam que a destruição dos serviços públicos é feita em seu beneficio, valem de pouco para esta família. Tomam a decisão racional e pegam no carro todos os dias (assim como a razão que levou a classe média a comprar casas em vez de as alugar, contribuindo para o endividamento do País, foi a mais pura das racionalidades: era mais barato). Ficamos todos a perder. Mas ficam contentes os propagandistas do regime. E o secretário de Estado dos Transportes, que acha que transportes públicos acessíveis e com apoios públicos são apenas para "quem não tem alternativa de mobilidade" (ou seja, para quem não pode andar de carro), também. Nada como ter governantes e "ideólogos" de governantes com uma cabeça subdesenvolvida para fazer o nosso país regressar ao Terceiro Mundo. Com uma economia irracional, cidades caóticas e atrasado em quase tudo. Seremos mais competitivo assim? Eles acham que sim.

 

Eu, seguramente um alien nesta terra enlouquecida, acho que uma das formas de medir o desenvolvimento e a racionalidade económica de um País é ver a qualidade dos seus transportes públicos e a quantidade e a variedade social das pessoas que os utilizam. E que parece que não aprendemos nada sobre algumas das razões do nosso atraso, que nos tornou mais vulneráveis a esta crise. Que olhamos para este país coberto de autoestradas e quase sem linhas férreas e depois ouvimos um secretário de Estado falar do transporte público como um complemento ao transporte individual e percebemos porque estamos como estamos. Estamos atrasados porque somos governados por cabeças atrasadas. Quanto tínhamos dinheiro, apostaram tudo no carro. Quando falta o dinheiro, cortam tudo no transporte público. Com ou sem dinheiro, a receita é sempre a mesma.»



por Daniel Oliveira

Novembro 09, 2011

Este senhor de facto nunca percebeu o 25 de Abril e menos ainda a democracia

Miguel Marujo

De uma notícia na Lusa: «Hoje, Portugal está "a atingir o limite", disse [Otelo Saraiva de Carvalho], corroborando o que há seis meses dissera à Lusa: "Se soubesse o que sei hoje não teria possivelmente feito o 25 de Abril". O coronel na reserva acredita que há condições para os militares tomarem o poder e vai mais longe: "bastam 800 homens". Em comparação com o golpe de 1974 -- do qual afirma ser um "orgulhoso protagonista" --, Otelo considera que um próximo seria até mais fácil, pois "há menos quartéis, logo menos hipóteses de existirem inimigos" da revolução.»

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