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Cibertúlia

Dúvidas, inquietações, provocações, amores, afectos e risos.

Março 14, 2004

Conspiração da esperança

Miguel Marujo

«Um homem tinha uma figueira plantada na sua vinha e foi lá procurar frutos, mas não os encontrou. Disse ao encarregado da vinha: "Há três anos que venho procurar fruto nesta figueira e não o encontro. Corta-a; para que está ela a ocupar a terra?" Mas ele respondeu: "Senhor, deixa-a mais este ano, para que eu possa escavar a terra em volta e deitar-lhe estrume. Se der frutos na próxima estação, ficará; senão, poderás cortá-la."»



do Evangelho deste domingo: Lucas. 13, 6-9

Março 14, 2004

O teórico da conspiração

Miguel Marujo

O conspiracionista-mor deste reino não é, definitivamente, Marcelo Rebelo de Sousa, submerso em mil leituras apressadas na sua missa dominical. Pacheco Pereira leva-lhe a palma. No seu blogue, desde quinta-feira, dia dos infames atentados de Madrid, só tem escrito com um propósito: apontar o dedo a uma perigosa esquerda que esfregaria as mãos de contentamento por os atentados serem da Al-Qaeda. É um insulto gratuito. Não há terroristas bons (todos são hijos de puta, como escrevemos aqui, naquelas horas).



O que não se admite a Pacheco Pereira é uma suposta superioridade moral. Lembro: a guerra contra o Iraque foi assente numa mentira, grosseira mentira, alicerçada num suposto engano de serviços secretos, mas que esqueceu o papel da ONU na vigilância ao regime odioso de Saddam.



Agora que a Al-Qaeda supostamente assume os atentados (como nos conta o Diogo), que afirmará Pacheco? Insistirá, como insistiu o líder do PP, Mariano Rajoy, ontem em dia de reflexão, na «autoria moral» da ETA? Ou sublinhará uma alegada aliança das «trevas», que é como quem diz a ETA aliada à Al-Qaeda, como defende hoje, em dia de eleições, a ministra Ana Palacios?



Os meus sublinhados não são inocentes: os populares (e Pacheco di-lo-á certamente) dizem que as manifestações de ontem contra o PP foram «ilegais» e partidarizadas. Não passa pela cabeça conspirativa de Pacheco que aqueles manifestantes se cansaram de mais uma «mentira». Mentiras que não significaram nada - mataram muita gente, continuam a matar todos os dias.



É isto: o que incomoda Pacheco (e seus acólitos) é que a mentira da guerra nunca foi a solução para paz nenhuma. Por isso, hoje os espanhóis votam contra todos os terrorismos. Mas também devem votar contra todas as mentiras. E contra a maior mentira - a da morte, a que defende a morte.



«Aqueles dispostos a abdicar da essencial liberdade em troca de uma segurança temporária, não merecem nem liberdade nem segurança.»

Benjamin Franklin, "Historical Review", 1759 [citado na Rua da Judiaria]



Nota final: contra mim escrevo neste "post" - assumi que era a ETA que tinha matado naquela manhã. Mas, ao contrário do polícia do pensamento correcto, não procuro tornar isto num desafio Benfica-Sporting. Eu, por mim, desde quinta-feira preferi lembrar os 200 mortos e os mais de 1400 feridos. Pacheco, hipócrita, nunca o fez.

Março 14, 2004

Vídeo

Miguel Marujo

Volto à carga, apenas para completar a informação.



O vídeo foi encontrado perto da Mesquita de Madrid e, nele, um suposto porta-voz "militar" da Al Qaeda na Europa (homem falando em árabe, com sotaque marroquino, e com roupa tipicamente árabe) assume a responsabilidade dos atentados terroristas cometidos no passado dia 11:



"Declaramos nuestra responsabilidad de lo que ha ocurrido en Madrid, justo dos años y medio después de los atentados de Nueva York y Washington. Es una respuesta a vuestra colaboración con los criminales Bush y sus aliados. Esto es como respuesta a los crímenes que habéis causado en el mundo y en concreto en Irak y en Afganistán y habrá más si Dios quiere. Vosotros queréis la vida y nosotros queremos la muerte, lo que da un ejemplo de lo que dijo el profeta Mahoma, si no paráis vuestras injusticias la sangre irá más a más y estos atentados son muy poco con lo que podrá ocurrir con lo que llamáis el terrorismo. Esto es un aviso del portavoz militar de Al Qaeda en Europa".*



A cadeia de televisão Telemadrid recebeu uma chamada de um homem com sotaque árabe, avisando de que teria deixado o vídeo na rua, perto da Mesquita da M-30, a circular rodoviária de Madrid. A Polícia encontrou a fita, que foi visionada e traduzida.



Estes dados, juntamente com a já referida detenção de três marroquinos, levam-me a pensar que se poderá vir a estabelecer uma ligação entre os atentados de Madrid e os que, em 16 de Maio de 2003, tiveram lugar em Casablanca. Aliás, já nessa altura, muita gente em Espanha mostrou preocupação pela proximidade do terrorismo islâmico. O que não é de estranhar, se se tiver consciência da permeabilidade existente entre Espanha e Marrocos.



Desta vez, a ETA parece não ter sido a culpada.



* tradução da responsabilidade de elmundo.es