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Cibertúlia

Dúvidas, inquietações, provocações, amores, afectos e risos.

Fevereiro 05, 2004

A polémica continua

Miguel Marujo

Já está! A polémica por mim lançada foi agarrada pelo Miguel! Adoro polémicas! Ehehe!

E esta é das boas, porque sendo absolutamente inócua e não se prevendo, por isso, que venha a prejudicar alguém, é, ao mesmo tempo, interessante e... edificadora.

Vou, por isso, continuar.



Sem prejuízo dos esperados comentários do Zé Salvado sobre a flora mediterrânica, gostaria de esclarecer duas coisas: em primeiro lugar, eu não disse que Portugal é um país mediterrânico. Sobre isto, poderia ser lançada uma nova polémica... e eu não quero ir por aí. Na verdade, eu próprio não tenho a certeza se acho que Portugal é um país mediterrânico. Tendo a pensar que não... embora gostasse de pensar o contrário. Ou seja, como gosto muito do Mediterrâneo e do que ele representa em termos culturais ou, se quiserem, civilizacionais, eu gostava que Portugal fosse um país mediterrânico; mas, no fundo, acho que não é.



O Miguel tem razão num aspecto: não haja dúvidas que a identidade portuguesa bebe das águas mediterrânicas. Nisso estou de acordo! Mas quando ele insinua que Matvejevitch considera Portugal um país mediterrânico, aí já não tenho tantas certezas. E cito, mais uma vez:



«Na realidade, a península Ibérica é mais um continente que uma península: prolongamento ou extremidade da Europa, ambas as coisas ao mesmo tempo. As suas terras do interior não são mediterrânicas, nem as suas costas o são de modo igual. Os Espanhóis não são um único povo, embora possuam em comum uma pátria, a Espanha: a cordilheira dos Pirinéus contribuiu, mais que a vontade própria deles, para que ficassem juntos. Passados diferentes compuseram a sua história comum: pedaços do país acabaram por conquistar o país inteiro. A Espanha mostrou que isso era possível e qual o respectivo preço. Os dois lados da península foram partilhados por dois mares, pelos horizontes de cada um deles, pelas vocações de um e de outro. O mar interior pouco prometia: os rivais dos Apeninos tinham entrado na corrida mais cedo, mantinham melhores ligações com as outras paragens, possuíam costas mais amenas. O oceano Atlântico permaneceu durante muito tempo desconhecido e parecia perigoso: era ali que havia que procurar a salvação. (Neste período imaginamos geralmente o mundo ibérico em conjunto, a Espanha e Portugal lado a lado.) A Espanha transmitiu uma parte de si mesma ao Novo Mundo: mais uma vez, fraccionou-se e esgotou-se. Mostrou que sabia conquistar melhor que conservar e que partilhava com dificuldade o fruto das suas conquistas (talvez justamente porque ela mesma estava partilhada). Neste novo mundo latino, a sua latinidade perdeu-se. A sua ligação com o Mediterrâneo deixou de a servir.»



Quantas polémicas não poderão estalar a partir de um não muito grande parágrafo... Mas tentemos focar-nos no essencial: Portugal é ou não é um país mediterrânico?



O Miguel traz o argumento musical. Talvez tenha razão quando diz que as sonoridades corsas e sardas são próximas das nossas. Talvez. Mas são certamente mais próximas entre si e das sonoridades catalãs ou occitanas...

Da mesma forma que também podemos encontrar proximidade entre algumas das nossas sonoridades e as sonoridades ditas celtas (galegas, asturianas, bascas, bretãs, galesas, irlandesas, etc.).



Não digo isto para contrariar o Miguel, mas sobretudo para apoiar Matvejevitch: a península Ibérica está culturalmente dividida entre duas massas de água - o Mediterrâneo e o Atlântico.

Seria fácil e tentador encerrar aqui a polémica dizendo que Portugal é mediterrânico e atlântico. Mas eu ainda não estou convencido. E, por isso, a polémica vai continuar: será a influência mediterrânica em Portugal capaz de rivalizar com o poderio da influência atlântica? Dão-se alvíssaras!

Fevereiro 05, 2004

Da geografia dos afectos

Miguel Marujo

O Portugal mediterrâneo não é apenas uma "gaffe" norueguesa. Predrag Matvejevitch de facto - como o Diogo abundantemente transcreve - também o acaba por "fazer" [«Breviário Mediterrânico» foi um dos meus livros de eleição no Verão passado, também para perceber o que se passa lá longe noutras paragens...]. Geograficamente, "strictu sensu", o Mediterrâneo acaba ali no estreito de Gibraltar. Era isso a que se referiam aqueles que falaram em "gaffe" principesca e (no meu caso) "ignorância" dos leitores do PD.


Mas, como insiste o Diogo, a nossa identidade também bebe a fonte mediterrânica. Concordo. Deixo as árvores para o Zé - e pego na música: quem ouve as polifonias corsas (pela mão de Hector Zazou) ou os "sonos" sardos de Elena Ledda não pode deixar de se surpreender com uma sonoridade tão visceralmente próxima de nós! Mas pego num exemplo português muito recente. O último álbum (que outros blogues têm elogiado - e que o "Retorta" nos mostra em fantásticas fotografias) da Ronda dos Quatro Caminhos que é uma «terra de abrigo» para coros alentejanos, uma orquestra sinfónica, vozes e instrumentos portugueses, espanhóis e árabes. É a prova viva que o estreito de Gibraltar é apenas um acidente geográfico. E (não é "gaffe") Predrag Matvejevitch tem razão.


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A Ronda dos Quatro Caminhos, in Ocarina

Fevereiro 05, 2004

Polémica Mediterrânica

Miguel Marujo

Tendo em conta a enorme adesão à polémica por mim lançada (ver abaixo), não podia deixar de insistir nela, desta feita com argumentos mais "terrenos", numa piscadela de olhos muito pouco subtil aos conhecimentos florestais do Zé Salvado (onde andas?!).



As citações são, uma vez mais, de Matvejevitch.



«A figueira assinala os limites do Mediterrâneo e alarga-os mesmo onde a oliveira recua. Segundo um provérbio rimado da Herzegovina, não é ao Sul a terra "em que o burro não zurra e a figueira não cresce". A alfarrobeira e a amendoeira acompanham-na ao longo dos rios, até ao primeiro afluente mais frio. A laranjeira e o limoeiro desaparecem para além das embocaduras dos rios, consoante os solos: transplantados para a bacia mediterrânica, acabaram por lhe pertencer e por se tornar emblemas dela. As plantas herbáceas, mais resistentes, vão mais longe, ultrapassam as montanhas: estão ali desde sempre. Algumas plantas aromáticas não tardam a desvanecer-se: o alfazema e o rosmaninho. O loendro, a jujubeira, e até o tenaz "maquis", extinguem-se sucessivamente, apesar da sua resistência ao vento. Apenas persiste a romãzeira (que vive nestas regiões há muito tempo), mas um pouco mais a norte torna-se ácida e brava: toma então outros nomes consoante as terras. A salva perde o seu vigor e as suas virtudes medicinais para além da zona mediterrânica; torna-se absinto. Do tamariz e do mirto apenas subsiste o nome, da palmeira e da tamareira a recordação, da alcaparra e do funcho um leve sabor. A composição e o cheiro da cebola e do alho são, perto do mar, sensivelmente diferentes das que têm nas regiões continentais. Os tomates (pomidori, pomos de ouro) são mais vermelhos e firmes na costa: quem poderia supor que também eles provêm de outros litorais? A giesta está inteiramente entregue ao Sul: vai buscar a sua cor amarela e o seu singular perfume à terra mais árida e talvez mesmo ao coração das pedras. Nas regiões meridionais o loureiro parece mais desenvolvido ou orgulhoso; à medida que avança para Norte, as suas folhas apertam-se e encarquilham. A coroa de louros continua a ser o atributo da glória, mesmo onde essa planta só é conhecida através da retórica. A vinha adpata-se, alternando variedades e virtudes, abandonando, ao que parece, algumas características bíblicas, salvo talvez ao longo de três ou quatro rios abençoados que recortam o continente. É muito difícil encontrar a mandrágora, que se tornou rara nestas costas: os marinheiros de Kotor levaram-me até ela, até perto de um rio chamado Ljuta (o Furioso), nas imediações do lago dito de Esculápio, não longe de Konavli, na fronteira entre a antiga República de Ragusa e o actual Montenegro, onde se cruzam o Mediterrâneo católico e o Mediterrâneo ortodoxo.»



Portugal é ou não é mediterrânico?

Fevereiro 05, 2004

Eu também me queixei à Câmara...

Miguel Marujo

... mas ainda não obtive solução, um ano depois. Enquanto isso...



Santana Lopes queixou-se ontem na reunião de câmara do ruído sentido na casa onde actualmente mora, na Rua Garcia de Orta, devido a obras num prédio contíguo ao seu, barulho que o impede de dormir de manhã cedo e perturba também o estudo aos filhos.



Por isso: o presidente da Câmara de Lisboa, Santana Lopes, está a considerar mudar de casa, da zona da Lapa para o Bairro Alto. Uma das hipóteses em vista é o palacete situado na esquina da Rua Fernandes Tomás, no Alto de Santa Catarina, próximo do Adamastor, onde morou Freitas do Amaral.



Senhor presidente, não me arranja um palacetezinho?